Josias de Souza
“Não compactuei nem compactuo com a corrupção”, disse Dilma Rousseff, na sexta-feira, ao discursar para militantes petistas na cidade de Recife. A oradora enganou-se. Entusiasmada com a delação de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, Dilma criticou os “usurpadores” do PMDB com tanto entusiasmo que esqueceu de mencionar um detalhe: a pilhagem ocorreu sob o seu nariz.
Além das confissões de Sérgio Machado, um apadrinhado de Renan Calheiros, há na praça outro corrupto confesso ligado ao PMDB: Fábio Cleto, um afilhado de Eduardo Cunha que serviu aos interesses partidários como vice-presidente de Fundos do Governo e Loterias da Caixa Econômica Federal. Embora já tenha sido avalizada pelo ministro Teori Zavaschi, relator da Lava Jato no STF, a delação de Fábio Cleto permanece sob sigilo.
Na Presidência, Dilma foi condescente com Machado e Cleto. Governar o Brasil não é de todo ruim. O horário é bom, o dinheiro dá para o gasto, viaja-se muito e há sempre a possibilidade de poder demitir os protegidos de Renan e Cunha, que deve proporcionar uma sensação boa. Mas Dilma manteve a dupla de delatores nos respectivos cargos até o limite da irresponsabilidade.
Machado não chegou a ser demitido por Dilma. Caiu de podre, em novembro de 2014. Quanto a Cleto, só foi enviado ao olho da rua em dezembro de 2015, depois que seu padrinho político deflagrou na Câmara o processo de impeachment de Dilma. Foi afastado por retaliação, não por corrupção. Ouvido à época, Cunha tripudiou: “Para o currículo dele, é melhor não estar nesse governo.''
A vida ofereceu a Dilma várias oportunidades para se livrar Sérgio Machado. E ela desperdicou todas. Em setembro de 2014, época de eleição presidencial, a Procuradoria da República denunciou Machado por improbidade. Fraudara licitação para a compra de oito dezenas de barcaças destinadas ao transporte de etanol. Dilma fingiu-se de morta.
Dias depois, em 10 de outubro, às vésperas da sucessão, veio à luz depoimento do delator delator Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras. Ele contou que recebera R$ 500 mil em verbas sujas das mãos de Machado. Dinheiro de propina. Dilma tachou de “estarrecedora” a divulgação do depoimento no período eleitoral. Sobre o conteúdo das denúncias, declarou o seguinte na ocasião:
“Em toda campanha eleitoral há denúncias que não se comprovam. E assim que acaba a eleição ninguém se responsabiliza por ela. Não se pode cometer injustiças.” E seguiu em frente, como se nada tivesse sido descoberto sobre o homem de Renan. Deu-se, então, o inusitado: a empresa PricewaterhouseCoopers, que audita as contas da Petrobras, disse que não assinaria o balanço anual da companhia enquanto Machado fosse presidente da Transpetro.
Dilma não se deu por achada. Foi preciso que Machado tomasse a iniciativa. Pediu licença do cargo. Em nota, escreveu que a acusação de Paulo Roberto era “francamente leviana e absurda, mas mesmo assim serviu para que a auditoria externa PwC apresentasse quedtionamento perante o Comitê de Auditoria do Conselho de Administração da Petrobras.”
Acrescentou: “Decido de forma espontânea requerer licença sem vencimentos pelos próximos 31 dias. Tomo a iniciativa de afastar-me temporariamente para que sejam feitos, de forma indiscutível, todos os esclarecimentos necessários.” Machado ainda renovou a licença um par de vezes antes de bater em retirada.
Hoje, Dilma se escora na corrupção confessada do PMDB para reforçar a tese do “golpe” e defender a sua volta triunfal ao Planalto. Mal comparando, madame age como o homem da anedota, que matou pai e mãe e, no seu julgamento, pediu misericórdia para um pobre órfão.
É como se Dilma quisesse a compreensão de todos para o sacrifício da sanidade nacional em nome da eliminação do mal que ela mesma criou com sua conivência com a roubalheira. No fundo, deve lhe doer a ideia de que fez o papel de uma rainha desastrada, numa peça confusa, em que o protagonista foi o Renan e cujo epílogo é o Cunha.
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