quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Defensores públicos que tentavam esconder salários integram a elite de 0,7% do país; a maioria ganha mais do que Alckmin para tentar impedi-lo de governar. Podem protestar! Eu adoro protestos! É inútil me xingar; tentem me contestar!

Hoje não começo o dia com CPI, não, embora eu vá falar a respeito, é claro! A propósito: hoje há debate na VEJA: Augusto Nunes, Marco Antônio Villa, Roberto Podval e eu. Assim que encerrar a sessão, a gente entra no ar. Adiante.
Andei fazendo aqui algumas críticas a defensores públicos do Estado de São Paulo. Muitos deles querem impedir o governo de governar e a Prefeitura de administrar a cidade. Comportam-se como se tivessem um mandato do povo para impedir a aplicação da lei, especialmente quando o assunto é droga e ocupação indevida de áreas públicas. Não hesitam um segundo em se alinhar com os que afrontam a lei e mandam o cidadão pagador de impostos, que arca com o peso de seus salários, plantar batatas. Eles se zangaram. A Defensoria decidiu emitir uma nota desastrada como reação às minhas críticas. E eu respondi, é claro! E olhem que sou praticamente o único jornalista que lhes cobra responsabilidade. Quase todo o resto da imprensa come por suas mãos e se deixa pautar bovinamente por eles sem nem mesmo tentar saber o que dizem as leis e a Constituição da República. Isso é apenas um fato. Volto a esses aspectos daqui a pouco. O que me traz aqui de imediato é outra coisa. No sábado passado, dia 4, escrevi um texto cujo título era este: “Defensores públicos, os ‘amigos dos vulneráveis’, dão um jeito de o povo não saber quanto eles ganham”. Por que eu o escrevi?
Obrigada pela Lei da Transparência a divulgar os salários dos seus integrantes, o que fez a Defensoria Pública? Deu um truque e tornou pública a tabela oficial com as faixas oficiais de salários. A tabela que se encontrava em seu site era esta. Vejam de novo. Volto em seguida.
Voltei
Por aí, como se vê, o salário dos defensores ia de R$ 11.235 (Nível I) a R$ 18.725 (Defensor Público Geral), ganhos, sem dúvida, muito convidativos, só que, infelizmente, falsos. Como informei naquele texto, em razão de acréscimos vários — tempo de serviço, por exemplo —, os ganhos deveriam ser bem maiores. Antes que continue, quero chamar a atenção de vocês para um dado objetivo, que é do IBGE, não meu! A mão de obra ativa brasileira, segundo dados de 2010, é de 92,6 milhões de pessoas. Sabem quantos ganham acima de 20 salários mínimos (R$ 12.440)? Apenas 0,7%, Isto mesmo, leitor amigo: ainda que os defensores públicos do Estado de São Paulo recebessem só o valor de tabela, isso já os colocaria no topo do topo da pirâmide salarial. Acontece que aqueles eram apenas números de referência. Não eram salários efetivamente pagos, COMO EXIGE A LEI DA TRANSPARÊNCIA.
Depois da crítica que fiz aqui, a Defensoria decidiu cumprir a lei e divulgou ontem o salário real de cada defensor público. É impressionante! Encontrei um único salário de R$ 12.920, um único de R$ 14.465, uns quatro ou cinco na faixa dos R$ 16 mil e poucos, dezenas, muitas delas, de R$ 17 mil a 19 mil e tantos e um calhamaço que ganha acima de R$ 20 mil!!! O máximo que se paga por lá, à diferença da tabela original, não são R$ 18.725, mas R$ 24.107,62.
Se algum leitor tiver tempo e paciência para calcular quantos são, percentualmente, os defensores na faixa de R$ 16 mil, R$ 17 mil, R$ 18 mil, R$ 19 mil e acima de R$ 20 mil, publico os números aqui. Deem depois uma olhada na tabela. Duvido que haja categoria profissional no Brasil, exceção feita a ministros de tribunais superiores, que tenha um salário médio tão elevado. E, no entanto, muitos deles querem brincar do quê? Ora, de luta de classes. Taí um assunto de que gosto. Passei boa parte da juventude lendo a respeito. Calma, senhores! Não se zanguem! Eu chego lá. Eu juro que eu também os quero ao lado dos pobres, defendendo seus direitos. Ah, sim: sabem quanto ganha o governador Geraldo Alckmin? R$ 18.725 brutos. Menos do que a maioria dos defensores.
Quem são os vulneráveis?
Há muito, uma boa parcela de defensores públicos — quantos? — se ocupa de uma agenda que é, na verdade, ideológica. Vejam o comportamento lamentável de muitos de seus integrantes no caso da retomada — pelo Estado de Direito! — da Cracolândia. Não só eles tentaram impedir a ação da Prefeitura e da polícia como recorreram à Justiça em busca de uma liminar para impedir a Polícia Militar de abordar os consumidores (e, por consequência, os traficantes) de crack.
Pergunto: quantas vezes eles recorreram à Justiça, no passado, para obrigar o Poder Público a cumprir uma de suas funções, que é reprimir o crime?. Quero lembrar a esses valentes que tráfico —  E CONSUMO — de drogas são crimes definidos em lei. Ocupar o espaço público, impedindo o direito de ir e vir, também. Com que então os senhores defensores dão uma solene banana para os moradores do Centro de São Paulo em nome do que chamam  ”proteção aos mais vulneráveis”? E quem protege os direitos daqueles que não conseguem botar o nariz fora da porta tão logo o sol se põe? Esses moradores de São Paulo, que pagam os altíssimos salários do senhores defensores — pertencem a 0,7% da mão de obra ativa —, não merecem atenção???
Uma das líderes na ação contra o cumprimento da lei — lamento ter de escrever assim — é Daniela Skromov (salário em julho: R$ 19.296). Foi participante ativa de uma audiência pública que pediu nada menos do que o afastamento do Comando da PM em São Paulo, tentou impedir a ação do estado e da Prefeitura na Cracolândia e compareceu a lançamento de site petista que faz campanha eleitoral aberta. Eu lhe dediquei um post no dia 27 de julho. Essa moça é capaz de afirmar coisas como esta:
“A autonomia de toda e qualquer pessoa, inclusive da pessoa que usa, abusa ou é dependente de drogas, é premissa no Estado Democrático de Direito. O mito de que o ‘viciado’ é alguém que não sabe o que quer se presta a legitimar invasões violentas. O autoritarismo se traveste de salvacionismo: é necessário proteger a pessoa dela mesma, importando menos o custo humano e psíquico que isso implica. A pessoa é usada como meio ‘para o seu próprio benefício’ e em especial a socialmente vulnerável é vista como uma constante ameaça contra os outros e contra si própria, numa visão paternalista típica de regimes autoritários, na contramão do imperativo da autodeterminação do sujeito e da dignidade humana, bases da ordem democrática.”
Entenderam? Por isso ela quer impedir a PM de atuar na Cracolândia. Ela ache o que quiser. Como defensora pública, tem de ser também uma procuradora da lei. Com esse salarião, é claro que ela não mora no Centro degradado da cidade. Também não tem viciados reunidos à porta de sua casa ou de seu prédio. Se isso acontecer,  vai fazer o óbvio: chamar a polícia. O mesmo vale para seus pares de militância na Defensoria. Não obstante, para os moradores da região central, que ganham um vigésimo do que ela recebe, a moça tem uma receita: não tocar nos viciados. Também são de sua autoria estas palavras, definindo a retomada da Cracolância: “Na verdade, o que existe é a intenção de uma valorização imobiliária da região central, e isso é um dos fatores que move essa ação de limpeza social”.
Podem vir quente que eu…
A maioria dos defensores é mais jovem do que eu. Conheço essa geração. Seus professores foram meus contemporâneos na universidade. É a “Geração PT”, uns monstrengos teóricos que confundem crime com luta de classes e banditismo com rebeldia. Um de seus mentores poderia ser o professor Vladimir Safatle, que já confundiu até terrorismo com política.
Depois que comecei a me interessar pelo assunto, recebi uma penca de ofensas. Passaram a me satanizar. Não estou acusando os defensores pelos xingamentos, é evidente — até porque nada tenho contra a Defensoria em si, embora o comando do órgão tenha emitido uma nota cretina, atacando “setores refratários aos direitos humanos”. Era comigo o negócio. Uma ova! Eu quero ver os defensores é com coragem para defender a massa de moradores de São Paulo que ganha até um mínimo, até dois, até três, até quatro, até cinco… Essa gente, valentões, paga o salário de vocês, acima de 20! E está sendo molestada pelo consumo e pelo tráfico. Ninguém defende violência contra os viciados — até porque se instalou na região um centro de tratamento. Mas o estado de direito tem de valer no Centro como vale em Moema, Alto de Pinheiros, Higienópolis, Vila Nova Conceição, Brooklin, Itaim Bibi, bairros que vocês conhecem muito bem, não é?
Querem brincar de luta de classes comigo? Perda de tempo! Comecem por não usar a sua suposta piedade de burgueses bem pensantes do capital alheio contra aqueles que arrecadam os impostos que são consumidos na forma de salários do funcionalismo. É claro que as funções de estado são necessárias. É por isso que existe a arrecadação. Como prestadores de serviço da Defensoria — que é de todos os paulistas —, vocês têm a obrigação legal, funcional, de zelar por todos eles. Inclusive, sim, por aqueles que têm seus imóveis degradados, ora! Ou será a propriedade um direito inumano? Não é que o que diz a Declaração dos Direitos Humanos, da ONU. Já leram? Está lá, no Artigo XVII:
“Todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros.
 Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.”
Andaram pulando essa parte?
Escutem uma coisa: eu não me assusto nem me intimido com correntes da Internet. Ao contrário! Elas me estimulam. Passei a me interessar por esse assunto agora. Vi na lista de salários uma coluna chamada “Atrasados”, por exemplo. O que significa? “Atrasado” de quê? São Paulo não atrasa vencimentos de servidores. Paga em dia. Como é que se geraram valores que podem chegar a R$ 3,880, R$ 4.632, R$ 5.617, R$ 10.551, SOMADOS AOS SALÁRIOS? Aí resolvi ler algumas leis, portarias etc. Espero não estar penetrando na Casa do Espanto, mas posso estar… Isso significa, por óbvio, que vou voltar ao assunto.
Assim, os inconformados que aprendam a argumentar em vez de se indignar; que aprendam a contestar as evidências em vez de me ofender. A Defensoria fez bem em divulgar os salários reais. E o fez depois que reclamei aqui. Espero que seja isso mesmo. Não, não! Eu não quero acabar com a Defensoria Pública, como sugerem alguns tontos; tampouco me ocorre difamá-la — não há uma só ofensa no que escrevo, um só xingamento. Ao contrário: xingado fui eu.  Só quero que ela cumpra os seus deveres legais. E, como sou curioso, continuarei a fazer perguntas, apegado apenas aos fatos. De resto, louvo em saber que os defensores, que sempre posam de heróis nas reportagens, não são, ao menos, mártires, não é mesmo? Ao contrário: a sua dedicada defesa dos “vulneráveis” lhes garante o topo do topo da pirâmide salarial. Numa linguagem puramente econômica, a gente poderia dizer que eles são o seu verdadeiro “ativo”.
O povo pobre, que trabalha, estuda e arrecada impostos para lhes garantir a boa vida, aguarda pelos senhores! Não tentem ser mais humanistas do que eu. Os que eu defendo — sem receber nada do estado por isso — são os milhões que suam para ganhar a vida. Eles têm de ter garantido o direito de ir e vir, independentemente das virtudes libertárias que dona Skromov possa enxergar num cachimbo de crak — desde que na boca alheia, é claro! Eu gosto desse assunto. Podem contar comigo, senhores defensores! O cachimbo — o moral — dos direitos humanos tem servido para entortar muitas bocas. Humanismo é comigo mesmo! Como disse certo imperador romano, no humano encontro tudo, até o divino. Vamos ao debate! 
Texto originalmente publicado às 4h32
Por Reinaldo Azevedo
REV VEJA

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