O
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, não tem, que eu saiba,
nenhum parente próximo que tenha participado dos grupos terroristas
Colina ou VAR-Palmares (ver post),
mas também é apontado como pré-candidato a uma vaga no Supremo, o que
mostra que eventuais vínculos de sangue com aqueles heróis não chegam a
constituir um critério único… Muito bem! Cardozo parece ter outra
qualidade que pode eventualmente compor o mix do Supremo: senso de humor
involuntário, quiçá uma queda para a ironia cínica. Ontem, o ministro
afirmou que “ainda não está muito claro” que dinheiro púbico tenha sido
usado pelos quadrilheiros, corruptos, corruptores e peculadores que
protagonizaram o mensalão. Reproduzo em vermelho a sua fala, conforme
registro de O Globo:
“Quando a
decisão do Supremo estiver estampada num acórdão, vamos ter um divisor
de águas sobre o que foi dinheiro público e o que foi dinheiro privado.
Até o momento, não me parece ainda muito claro. A partir desse acórdão é
que as medidas poderão ser tomadas, se comprovado que houve uso de
dinheiro público”.
Como??? “SE COMPROVADO QUE HOUVE USO DO DINHEIRO PÚBLICO”??? Sabem onde estava este senhor quando deu tal declaração? Na 15ª Conferência Internacional Anticorrupção! É um escracho! É um acinte! É um deboche!
Henrique
Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil foi condenado por
peculato por ONZE A ZERO no Supremo! Nem Ricardo Lewandowski e Dias
Toffoli conseguiram fugir à evidência. O peculato é roubo de… dinheiro
público!!! Se público não fosse, peculato não seria, certo ministro? Ou
este que dizem pré-candidato o Supremo tem alguma outra particular
leitura da questão? Terá já revogado também o sentido das palavras?
Beira a
cara de pau afirmar que não está muito claro, no julgamento do Supremo,
se o dinheiro era público ou não, razão por que seria preciso esperar o
acórdão. Vai ver, então, existe a possibilidade de os ministros
condenarem os peculadores, omitindo, depois, no texto final do processo,
o crime cometido.
É
impressionante que alguém que ocupa cargo tão importante na República
engrole essa retórica do despiste. Cardozo pode até insistir naquela
ladainha de que os R$ 76,7 milhões eram da Visanet, não do BB, embora
os autos provem o contrário. Ele pode, em suma, ser mais um a dizer que o
Supremo está errado, atacando, também ele, o tribunal. Afirmar, no
entanto, que a corte não deixou claro se o dinheiro era público é
simplesmente uma mentira factual. Fazê-lo num seminário que debate o
combate à corrupção é provocação ou humor involuntário.
Achando que não tinha enrolado o bastante, Cardozo disse esta outra coisa fabulosa:
“O Supremo confirmou no voto, mas é preciso ver no texto o que ele vai precisar. O acórdão vai balizar as ações que virão a posteriori, e é importante colocar o preto no branco”.
“O Supremo confirmou no voto, mas é preciso ver no texto o que ele vai precisar. O acórdão vai balizar as ações que virão a posteriori, e é importante colocar o preto no branco”.
Heeeinnn? O quê? Como assim?
Quer dizer
que existe a possibilidade, senhor ministro da Justiça, de aquilo que
foi confirmado pelo voto unânime de 11 ministros não estar devidamente
explicitado no acórdão? A quem se encomendará tal peça? À Executiva
Nacional do PT?
Mais pudor!
Por pudor, José Eduardo Cardozo não deveria nem comentar esse caso. É ele o autor da Lei 12.232 que regularizou, com efeito retroativo, a apropriação indevida dos chamados bônus de volume pelas agências de publicidade que trabalham para estatais — e uma das condenações de Pizzolato por peculato tem a ver justamente com isso. O artigo que deu efeito retroativo à lei, o que é um escândalo, não é de sua autoria, mas, solerte, ele se calou e permitiu que o absurdo fosse consumado. A lei que leva a assinatura do agora ministro foi excomungada pelo Supremo. O presidente do tribunal, Ayres Britto, considerou que ele foi “escrito sob medida”; acusou-o de ter sido feito “intencionalmente” e “maquinadamente” para legalizar o ilegal. Chamou a lei de “atentado veemente” à Constituição.
Por pudor, José Eduardo Cardozo não deveria nem comentar esse caso. É ele o autor da Lei 12.232 que regularizou, com efeito retroativo, a apropriação indevida dos chamados bônus de volume pelas agências de publicidade que trabalham para estatais — e uma das condenações de Pizzolato por peculato tem a ver justamente com isso. O artigo que deu efeito retroativo à lei, o que é um escândalo, não é de sua autoria, mas, solerte, ele se calou e permitiu que o absurdo fosse consumado. A lei que leva a assinatura do agora ministro foi excomungada pelo Supremo. O presidente do tribunal, Ayres Britto, considerou que ele foi “escrito sob medida”; acusou-o de ter sido feito “intencionalmente” e “maquinadamente” para legalizar o ilegal. Chamou a lei de “atentado veemente” à Constituição.
Mais pudor, ministro!
Imaginem, agora, Cardozo no Supremo…
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