quarta-feira, 3 de maio de 2017

Fachin manda habeas de Palocci para Plenário do Supremo

Derrotado sucessivamente na 2.ª Turma da Corte, relator da Lava Jato decide submeter a todo o colegiado pedido do ex-ministro dos Governos Lula e Dilma

Após três derrotas consecutivas na 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, o ministro Luiz Edson Fachin, relator da Lava Jato, decidiu levar para o plenário da Corte o pedido de habeas corpus do ex-ministro Antônio Palocci. Fachin negou liminarmente (caráter provisório) o pedido de liberdade do petista, mas decidiu submeter o caso para ser decidido em conjunto pelos 11 ministros do Tribunal.
A estratégia foi adotada pelo relator da Lava Jato depois de ficar vencido por três vezes em decisões sobre prisões preventivas. A 2ª Turma decidiu, por maioria, soltar o ex-ministro José Dirceu, o pecuarista José Carlos Bumlai e ex-assessor do PP João Cláudio Genu.
“Na data de hoje indeferi o pedido de liminar, solicitei informações e determinei fosse colhido parecer do Ministério Público. Desde já, nos termos do art. 21 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, submeto o julgamento do mérito do presente ‘habeas corpus’ à deliberação do Plenário”, escreveu o ministro, em despacho desta quarta-feira, 03.
Ao analisar a situação de Palocci, o Tribunal deve discutir o cabimento de pedidos de liberdade feitos por presos preventivos que, na cadeia, forem condenados em primeira instância.
Na 1ª Turma, da qual Fachin fazia parte antes da morte de Teori Zavascki em janeiro, o entendimento é mais rigoroso. Para os ministros que compõem o colegiado, um habeas corpus contra prisão preventiva não deve seguir após a condenação em primeira instância.
A 2ª turma, na qual a Lava Jato é julgada, entendeu nos julgamentos recentes que a manutenção da prisão preventiva, sem fundamento suficiente, após a condenação em primeira instância desrespeita a jurisprudência do STF segundo a qual a execução da pena começa após condenação em segunda instância.
Na semana passada, depois de o STF liberar Bumlai e Genu, os ministros Alexandre de Moraes e Rosa Weber defenderam que o entendimento seja uniformizado no STF.
COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA JOSÉ ROBERTO BATOCHIO, DEFENSOR DE PALOCCI
“O artigo 21 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal não elenca as hipóteses do anormal deslocamento do julgamento dos feitos da Turma, que é o juiz natural, para o Plenário. No caso, o eminente ministro Fachin não deu as razões do deslocamento dessa competência horizontal, de modo que fica-se sem saber quais as recônditas razões determinantes da providência. Interessante seria que a defesa pudesse conhecer das motivações dessa decisão para que compreendesse, ou não, os motivos que a inspiraram.” DO ESTADÃO

General critica STF

Ex-comandante na Amazônia e das tropas brasileiras no Haiti, o general da reserva Augusto Heleno, uma das vozes mais respeitadas no meio militar, divulgou texto ácido contra a soltura de presos condenados pela Lava Jato. “Será que os doutos ministros do STF avaliam o mal que têm causado ao País”, provocou.
Segue a íntegra:
“Será que os doutos Ministros do STF avaliam o mal que têm causado ao país? Ou o Olimpo em que vivem os afasta totalmente da consciência nacional? Façam uma pesquisa para avaliar o que a população honesta pensa, hoje, da instituição em que militam. Vossas Exas votam calcados em saber jurídico? Não parece. Para a imensa maioria, fingem fazê-lo. Em votos prolixos e tardios, dão vazão a imensuráveis vaidades, a desavenças pessoais e a discutíveis convicções ideológicas. Hoje, transmitem à Nação , alarmada pela criminalidade e corrupção que se alastram, uma lamentável insegurança jurídica e uma frustrante certeza da impunidade. Passam a sensação de que o Brasil, com esse Tribunal, não tem nenhuma chance de sair do buraco; e colocam em sério risco nossa combalida e vilipendiada “democracia”. Sabemos que são professores de Deus e lhes pedimos,apenas, que desçam do pedestal e coloquem o Brasil acima de tudo.”
Gen Ref Augusto Heleno Pereira DO ESTADÃO

STF tem maioria para permitir que Pimentel seja processado sem aval da Assembleia

Ministros julgam ação do DEM que questiona artigo da Constituição mineira que diz ser preciso autorização prévia do parlamento para julgar governadores

BRASÍLIA - A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu nesta quarta-feira, 3, que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não precisa de autorização prévia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais para tornar réu e julgar governadores do Estado. A Corte retomou na tarde desta quarta-feira o julgamento de uma ação do partido Democratas que pede que o recebimento de denúncia contra o governador não seja condicionado ao aval de deputados estaduais.
Foto: Dida Sampaio|Estadão
Fernando Pimentel (PT-MG)
Já se manifestaram nesse sentido os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Marco Aurélio Mello, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes. Apenas o ministro Dias Toffoli votou em sentido contrário até agora.
O ministro Alexandre de Moraes, com quem o julgamento retomou, chamou de “norma-obstáculo” a necessidade de autorização prévia prevista em algumas constituições estaduais, e afirmou que ela é uma “degeneração atentou contra uma das cláusulas pétreas da Constituição Federal: a separação dos poderes”.
“A norma-obstáculo prevista nestas constituições estaduais acabou por subtrair o exercício da jurisdição penal do Superior Tribunal de Justiça nas hipóteses referentes aos governadores de Estado. A degeneração do espírito desta norma em sua aplicação concreta desvirtuou totalmente sua configuração original, resultando sua utilização prática um verdadeiro escárnio aos princípios regentes da República, com a clara, flagrante e ostensiva finalidade de criação, por parte dos governos estaduais, de um verdadeiro escudo protetivo para prática de atividades ilícitas pelos chefes dos poderes executivos estaduais e distrital”, afirmou Moraes, acompanhando o relator, ministro Edson Fachin.
“Não é uma questão de certo ou errado, mas de muitas vezes a interpretação ser produto do seu tempo, e acho que no tempo atual, das 52 solicitações feitas (a assembleias legislativas) pelo Superior Tribunal de Justiça (para processar governadores de todo o País), mais da metade nem foi respondida”, destacou Barroso ao defender a dispensa de autorização prévia.
Suspensão. Tanto Moraes como Barroso votaram, também, para que seja considerada inconstitucional a previsão da Constituição estadual de Minas Gerais de que os governadores do Estado devem ser afastados automaticamente em caso de recebimento de denúncia no STJ. “Entendo como consequência lógica do afastamento da necessidade de autorização prévia para o início da persecução penal em juízo contra os governadores de Estado, como consequência lógica desse afastamento, também a declaração inconstitucionalidade da automática suspensão do governador de Estado ou do DF do exercício do cargo”, disse
Caso o entendimento destes dois ministros não permaneça, a permanência do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), no mandato, ficará ameaçada, pois bastará que o STJ receba denúncia contra ele, tornando-o réu, para que ele perca o cargo.
Segundo o Broadcast Político apurou, o ministro Herman Benjamin pretende levar o caso de Pimentel de volta à Corte Especial do STJ o quanto antes, tão logo o STF concluir o julgamento.
Em outubro do ano passado, a Corte Especial do STJ decidiu por 8 votos a 6 que a abertura de ação penal contra Pimentel depende de uma prévia autorização da Assembleia Legislativa mineira, em um julgamento marcado por bate-boca entre ministros.
Denúncia. Em maio do ano passado, a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou Pimentel ao STJ por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no âmbito da Operação Acrônimo. O petista é acusado de receber propina da montadora de veículos Caoa para favorecê-la no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, pasta que comandou de 2011 a 2014 durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff.
O governador e a empresa negam irregularidades no caso. DO ESTADÃO.

Há no país 221 mil sub-Dirceus, presos provisórios esquecidos em calabouços

Josias de Souza

Sergio Moro costuma dizer que as críticas às prisões preventivas da Lava Jato revelam a existência no Brasil de uma “sociedade de castas”, marcada pela ausência de “igualdade republicana”. Ao colocar José Dirceu em liberdade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal potencializou a avaliação do juiz da Lava Jato. Destrancou-se a cela sob o argumento de que a prisão de Dirceu representa um constrangimento ilegal. Alegou-se que, embora ele tenha sido condenado por Moro, as sentenças contra o marquês do PT ainda não foram confirmadas por um tribunal de segunda instância. Por esses critérios, o Judiciário precisa libertar outros 221 mil brasileiros. São sub-Dirceus, presos provisórios que, segundo o Conselho Nacional de Justiça, mofam na cadeia à espera de julgamento.
Apenas dois detalhes diferenciam Dirceu dos sub-Dirceus. O ex-chefe da Casa Civil de Lula já coleciona duas sentenças. Juntas, somam 32 anos e um mês de prisão. Dispõe da melhor defesa que o prestígio e o dinheiro podem bancar. Os outros 221 mil presos provisórios ainda não passaram pelo crivo de nenhum juiz. Permanecem atrás das grades sem sentença porque são pobres e não dispõem de advogados competentes para lembrar ao Judiciário que seus processos mofam nos escaninhos. Em janeiro, a ministra Cármen Lúcia, presidente da Suprema Corte, defendeu um “choque de jurisdição” para interromper o constrangimento ilegal a que estão sendo submetidos os presos da casta esquecida.

Dirceu ganhou a liberdade por um placar de 3 a 2. Um dos que votaram pela abertura da cela foi Dias Toffoli. Indicado para o Supremo por Lula, o ministro foi subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil na época em que a pasta era comandada por Dirceu. Entretando, guiando-se por autocritérios, Toffoli não se considera impedido de participar de julgamentos envolvendo o ex-chefe. Mandou soltá-lo por acreditar que são pequenas as chances de Dirceu voltar a praticar crimes. Realçou, de resto, que a prisão preventiva é ''uma antecipação da pena''.
Toffoli deu de ombros para o relator da Lava Jato, ministro Edson Fachin, que ecoara minutos antes palavras de Sergio Moro: “Entendo que a manutenção da prisão preventiva do paciente [Dirceu] encontra-se plenamente justificada pela lei e pela jurisprudência desta Corte, inclusive desta Segunda Turma. Rememoro que, para esta Segunda Turma, é justificada a prisão preventiva quando fundada na garantia da ordem pública, em face do risco concreto de reiteração delitiva…”
Chama-se Ricardo Lewandowski o ministro que proferiu o segundo voto a favor da soltura de Dirceu. Em agosto de 2007, quando a denúncia da Procuradoria sobre o escândalo do mensalão foi convertida pelo Supremo em ação penal, Lewandowski discordou do então relator Joaquim Barbosa quanto ao acolhimento da denúncia contra Dirceu e José Genoino por formação de quadrilha. Terminada a sessão, Lewandowski foi jantar com amigos num restaurante brasiliense chamado Expand Wine Store. Em dado momento, soou-lhe o celular. Era o irmão, Marcelo Lewandowski. O ministro levantou-se da mesa e foi para o jardim externo do restaurante.
A repórter Vera Magalhães, acomodada em mesa próxima, escutou Lewandowski declarar coisas assim: “A imprensa acuou o Supremo. […] Todo mundo votou com a faca no pescoço.” Ou assim: “A tendência era amaciar para o Dirceu”. O ministro deu a entender que, não fosse pela “faca no pescoço”, poderia ter divergido muito mais de Barbosa: “Não tenha dúvida. Eu estava tinindo nos cascos.”
Na Segunda Turma, Lewandowski tiniu a favor de Dirceu de forma aguda. Deu razão a Toffoli. Declarou que prisões como a de Dirceu, escoradas apenas em sentenças de primeira instância, são vedadas pela Constituição. “A prisão preventiva dilatada no tempo, por quase dois anos, afronta o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade”, acrescentou. Suprema ironia: na legião de sub-Dirceus, há presos encarcerados a 974 dias —são mais de dois anos e meio em cana sem uma mísera sentença condenatória. Pior: na grossa maioria dos casos, não há vestígio de uma toga que esteja tinindo nos cascos para reverter o flagelo.

O terceiro voto a favor de Dirceu foi proferido por Gilmar Mendes. O ministro havia vaticinado em fevereiro: ''Temos um encontro marcado com essas alongadas prisões de Curitiba''. Reconheceu que as acusações que pesam contra Dirceu são graves. Mas concordou com Toffoli e Lewandowski, seu desafeto. “Não é o clamor público que recomenda a prisão processual. Ainda que em casos chocantes, a prisão preventiva precisa ser necessária, adequada e proporcional. Aqui, temos um condenado ainda em presunção de inocência”, enfatizou.
Gilmar queixou-se dos procuradores da força-tarefa da Lava Jato que, horas antes, anunciaram a apresentação de nova denúncia contra Dirceu. O ministro enxergou na iniciativa uma tentativa pueril de constranger o Supremo. “Se nós devêssemos ceder a esse tipo de pressão, quase que uma brincadeira juvenil —são jovens que não têm a experiência institucional nem vivência institucional. Por isso, fazem esse tipo de brincadeira— se nós cedêssemos a esse tipo de pressão, nós deixaríamos de ser Supremo. Curitiba passaria a ser o Supremo. Não se pode imaginar que se pode constranger o Supremo Tribunal Federal, porque esta Corte tem história mais do que centenária. Ela cresce nesses momentos. Creio que hoje este tribunal está dando lição ao Brasil.”
Crítico contumaz do Ministério Público, Gilmar encontrou na nova investida da Lava Jato contra Dirceu ótima matéria-prima. O próprio procurador Deltan Dellagnol, coordenador da força-tarefa de Curitiba, admitiu que a denúncia foi antecipada por conta do julgamento do pedido de habeas corpus de Dirceu. Até ministros que não integram a Segunda Turma do Supremo consideraram a iniciatica inoportuna. Mas Gilmar soou contorverso quando disse que a libertação de Dirceu agigantou o Supremo e ofereceu uma lição ao Brasil. Como a decisão não foi unânime, a plateia pode considerar que o decano Celso de Mello, único a votar a favor da tranca além do relator Fachin, oferece ensinamento mais adequado.
Onde Gilmar enxerga abuso, o decano vê um rigor necessário, compatível com a magnitude do crime. “Não fosse a ação rigorosa, mas necessária do Poder Judiciário, é provável que a corrupção e lavagem de dinheiro estivessem perdurando até o presente momento”, disse Celso de Mello. “O fato é que, quer sejam os crimes violentos ou não ou crimes com graves danos ao erário, a prisão cautelar justifica-se para interrompê-los e, o que é mais importante, para proteger a sociedade e outros indivíduos de sua reiteração.”
Escorando-se em informações de Sergio Moro, Celso de Mello recordou que Dirceu tripudiara do Supremo. “O mais perturbador em relação a José Dirceu de Oliveira e Silva consiste no fato de que recebeu propina inclusive enquanto estava sendo julgada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal a ação penal 470, o mensalão, havendo registro de recebimentos pelo menos até 13 de novembro de 2013. Nem o julgamento condenatório pela mais alta Corte do país representou fator inibitório da reiteração criminosa, embora em outro esquema ilícito. A necessidade da prisão cautelar decorre ainda do fato de José Dirceu de Oliveira e Silva ser recorrente em escândalos criminais”.
Ao discorrer sobre sua teoria das castas, Moro costuma dizer que os reparos às prisões preventivas da Lava Jato embutem “o lamentável entendimento de que há pessoas acima da lei.” A presença de 221 mil sub-Dirceus no sistema prisional reforça o fenômeno. No Paraná, onde está presa a turma do petrolão, 48,6% da população carcerária é composta de presos provisórios. Em Sergipe, os sem-sentença somam 82% dos presos. Em Alagoas, 81%. Um acinte.